Susana Aríns
E isso é o amor
a visionar a verbena do Caxade
lembrei
que marina ia de socos
e balouçava na mão
limpos sapatos de salto brancos
e guardava os socos
tão tosquinhos e de madeira
entre as pedras de um valado
e calçava os brancos sapatos
de ponta descuberta
[sandálias ló, dizia eu]
cala e escuita,
que este conto é nosso:
e luzia unhas pintadas
e botava a baila com pepe
e outra baila e uma rumba
e três carinhos clandestinos
e mudava sapatos [sandálias]
por socos e voltava ao carreiro
de lama com a música e os beijos
ainda a dançar
no rosado das unhas dos pés
abrigados na camurça dos socos
e lembrei
que uma noite
alguém levou os socos voaram
ou marina esqueceu o agocho
ou pepe escondeu para durar a festa
e houve de fazer o caminho todo
de curantes ao fojo
com os sapatos da mão
para não estropiar-lhes a brancura
e os pés descalços
e as unhas rosas
e a música e os beijos
e o amor todo a dançar
na frescura da lama
lembrei isso.
Tu contas e eu conto.
BIO
Vila Garcia de Arouça, 1974. É Licenciada nas Filologias Hispanica e Portuguesa pola USC e actualmente exerce de professora de ensino secundario no lES da IIha de Arouça. Participou activamente na dinamizaçom da vida sócio-cultural estradense, especialmente numha longa etapa como integrante da Asociaçom de Tempo Livre mistura. Foi ganhadora do XXI Premio Nacional de Poesía Pérez Parallé com a obra [de]construçom, editada por Espiral Maior (2009). Posteriormente publicou aquiltadas (Estaleiro Editora, 2012), a noiva e o navio (Através Editora, 2012), seique (Através Editora, 2015), Carne da minha carne (Apiario, 2018) e Tu contas e eu conto (Através Editora 2018). Na actualidade faz parte, também, da plataforma de crítica literária A Sega.